sábado, 26 de setembro de 2015

Homossexualidade

OK. Está na hora de esclarecer umas coisas. Na verdade, já passou muito da hora de esclarecer os direitos LGBT, e de uma vez por todas.

Foto de Charles McQuillan/Getty Images disponível no TheGuardian.com
    Vamos ver... por onde começar? Já sei! Por que não pelos princípios do liberalismo? Direito à vida, à propriedade, à liberdade. Liberdade! Mas que tipo de liberdade? Liberdade de expressão, liberdade religiosa, liberdade de imprensa, liberdade econômica e as liberdades individuais. Ainda, a laicização do Estado, um sistema governamental democrático, e a igualdade de tais direitos para todos os cidadãos, incluindo a igualdade jurídica e a noção de que todos os homens e mulheres nascem iguais. Pronto. Aqueles que não concordam com um ou mais desses direitos não é liberal. Pode ser stalinista, maoista, fascista, nazista, anarquista, capitalista, comunista, feudalista, absolutista ou até "tribalista", mas liberal não é. Tendo isso em conta, que tal discutir esses princípios?
     Em primeiro lugar, e isso tem de ficar bem claro, é absolutamente importante não confundir LIBERDADE RELIGIOSA com o direito de IMPOR a sua religião aos outros. Ter liberdade de religião é ser livre para cultuar, vangloriar, meditar e, enfim, exercer ato religioso de natureza qualquer contanto que este não infrinja ou ataque a liberdade do outro. Portanto, querer impor valores  ou morais religiosos a toda uma população seria contrário aos princípios liberais, primeiramente, porque o Estado deve ser LAICO, e em segundo lugar, porque o próprio princípio de liberdade religiosa não permite que um cidadão seja obrigado a seguir os valores ou morais de qualquer religião que não seja a de sua escolha. Um político que exerce tal medida é anti-liberal e aproxima-se das ideologias fascistas/nazistas e absolutistas. Assim, estabelecer num país um "estatuto da família" baseado em tradições e valores religiosos (cristãos, por exemplo) é uma ação anti-liberal.
     Lembremos que um princípio liberal tem limites, pois não deve infringir ou estar em desacordo com os outros. Portanto, por mais que a maior parte da população concorde com um "estatuto da família" de fundamento religioso, isto é, seja democraticamente aceito, tal estatuto, por entrar em oposição com a liberdade religiosa e a laicização do Estado, não é valido, pelo menos de acordo com os princípios de uma sociedade liberal. Não é a toa que soa absurdo um seguidor do islamismo subir ao poder no Brasil e tentar obrigar todas as mulheres a vestir hijab, ou então um homossexual fundamentalista radical (se é que existe) determinar um estatuto da família que reconheça apenas casais homossexuais, mesmo se ambas situações fossem democraticamente aceitas. Ora, se não aceitaríamos um estatuto que reconhecesse apenas a homossexualidade (mesmo se a maioria de nós fosse homossexual), então porque aceitar um que só reconhece casais heterossexuais? O fato de uma lei ser democrática não a impede de ir contra aos princípios liberais.
    A Liberdade de expressão também tem limites. Somos livres para ser racistas, mas não para exercer atos racistas, porque infere a noção de que uma raça é superior a outra, e se esse fosse o caso seria aceitável tratar um grupo de maneira diferente perante a lei, assim estando em contra-posição à igualdade jurídica e aproximando-se novamente ao fascismo/nazismo. Da mesma forma, somos livres para ser homofóbicos (ou "ser contra", "não aceitar", etc.), mas não para cometer atos de homofobia.
     Para finalizar esse papo de liberalismo e seguirmos ao próximo tópico, é relevante mencionar também o infame "casamento gay" ou união civil entre pessoas do mesmo sexo, que na verdade deveria ser chamado apenas união civil. Explicar tal polêmica a partir de um ponto de vista liberal é muito simples – se todos os cidadãos devem possuir igualdade de direitos e jurídica (igualdade perante a lei), então é extremamente errado negar o direito de união civil a um certo grupo de pessoas, ainda mais por motivos de valores religiosos. Concluindo esta parte, que fique claro:

SER A FAVOR DO ESTATUTO DA FAMÍLIA PROPOSTO PELA ATUAL CÂMARA DOS DEPUTADOS (set/2015) E CONTRA O DIREITO DE UNIÃO CIVIL ENTRE PESSOAS DO MESMO SEXO NÃO É SÓ UMA ATITUDE NÃO LIBERAL, MAS ANTI-LIBERAL.

    Ufa, que bom que resolvemos isso. Agora, adiante!

    Muitos ainda tentam justificar posições homofóbicas apelando a argumentações supostamente científicas, exaltando, por exemplo, o fato de que relações homossexuais não geram prole (filhos, descendentes, etc. – chame-os como quiser). Esse argumento é de nível tão infantil e atrasado que chega até a ser estúpido. Se fosse assim, todos os casais heterossexuais deveriam ser proibidos de utilizar métodos anticoncepcionais, e pessoas inférteis, homens que fizeram vasectomia e pessoas que não pretendem ter filhos não deveriam ter o direito de se casar (nem ter a legitimidade de suas relações reconhecida).
    Seja sincero, soa estúpido, não? Até porque existe algo chamado adoção, conhecem? Ou quem sabe aquele método que a espécie humana inventou por causa de sua inteligência aguçada decorrente de processos evolutivos de adaptação, chamado inseminação artificial? Acredita? Diferentemente do restante dos animais, os seres humanos descobriram técnicas de reprodução que não requerem mais a ocorrência de relações sexuais para gerar um feto. E, com a ajudinha de uma barriga de aluguel, tal técnica torna-se perfeita para casais homoafetivos. Então não há mais porque continuar implicando em tradições que não são mais imperativas para que a reprodução seja possível. Utilizamos os métodos que bem desejarmos, dentro dos nossos limites (financeiros, principalmente).
     Dizer que a homossexualidade é errado do ponto de vista biológico é também um grande equívoco. Não só porque, como já expliquei, a reprodução não deixa de ser possível em tais relações, mas também porque a teoria da evolução não expressa um objetivo. Ela apresenta uma tendência dos seres vivos à transmissão e sobrevivência de material genético. Não há como "falhar" ou "ganhar" a evolução. Produzir descendentes e garantir a sobrevivência de material genético demonstra sucesso em dar continuidade à espécie e nada mais. Dar continuidade à espécie não é, porém, um objetivo universal, uma regra a ser seguida por todos os seres vivos.
     Outro importante esclarecimento é o fato de que homossexualidade não é uma opção, mas uma orientação sexual. Não só por razões óbvias – ninguém escolheria uma vida de discriminação e desrespeito – mas porque inúmeras tentativas de "cura gay" ou tratamento fracassaram (e ainda fracassam) ao longo do século XX. Tratamentos com medicamentos hormonais, psicológicos (behavioristas, psicanalistas, etc) ou "supressão de desejos" nunca funcionaram e não funcionam. Supostas "curas e transformações" são explicadas pelas seguintes opções:

- Tal "curado" nunca foi homossexual ou é bissexual;
- Fraude;
- O "curado" ainda é homossexual e reprime ou rejeita seus impulsos e desejos homossexuais (portanto finge ser heterossexual, mas nunca será sexualmente atraído pelo sexo oposto)

     Não é a toa que países como a Inglaterra aboliram qualquer tipo de tratamento à homossexualidade. Além disso, vários estudos (como este, este, este e este) apontam o caráter genético e biológico da homossexualidade. Vídeo para os leigos (em inglês): 


     Agora sim, para finalizar, a última questão a ser esclarecida. Talvez o presidente da câmara dos deputados Eduardo Cunha não saiba, mas os homossexuais não possuem mais direitos do que os héteros. Uma lei que criminaliza a "heterofobia" é absurda porque ninguém é oprimido por ser hétero. Héteros não são negados o direito de se casar (por serem héteros). Héteros não são expulsos de um estabelecimento por serem héteros. Héteros não são demitidos por serem héteros. Não sofrem bullying, ofensas e humilhações por serem héteros. Não são agredidos no meio da rua por causa de sua vida afetiva. Não são rejeitados e menosprezados pelos pais devido à sua sexualidade. Não são vistos como doentes mentais ou pervertidos quando se engajam em relações sexuais com pessoas do sexo oposto. Ninguém compara heterossexualidade com pedofilia e zoofilia. Héteros não são oprimidos desde a Idade Média (+1500 anos!) por causa de sua orientação e com certeza não estão sendo oprimidos agora. Héteros não são um grupo social porque sua vida é tida como normal, como padrão. Orgulho gay, caso não saiba, é uma forma de dizer que, apesar de toda discriminação, desrespeito e opressão que sofrem, não têm vergonha de ser quem são. Aliás, as paradas de orgulho LGBT surgiram como celebração dos direitos conquistados principalmente após Stonewall nos EUA. Agora, se alguém me achar a necessidade de haver um dia de "orgulho hétero" que não seja "se os gays podem, nós também podemos", visto que eles não sofrem nenhum tipo de opressão, por favor, estou ouvindo (ou lendo)!

     Então, pelo amor de JAVÉ, BUDA E GANESHA, será que dá pra ter um pouco de maturidade e respeitar escolhas individuais que não afetam, não alteram, prejudicam, enfim, não fazem 
A MENOR DIFERENÇA EM SUAS VIDAS ?


Foto de Brian Lawless/PA, disponível no TheGuardian.com